Em meio a pandemia, Senado "passa boiada" e aprova a privatização da água

O Senado aprovou, em sessão no dia 24 de junho, o Projeto de Lei (PL) nº 4162/19, que cria um novo marco legal do saneamento básico, apesar da forte resistência dos movimentos sociais e organizações que defendem a água como um bem público e que denunciaram que a aprovação do PL cria um monopólio privado para a água e o esgoto no Brasil.

O projeto teve 65 votos a favor e 13 contra. Apenas os senadores do PT votaram contra a proposta. Dos três senadores gaúchos, Lasier Martins (Podemos) e Luiz Carlos Heinzel (PP) votaram pela aprovação do Projeto e o senador Paim (PT), contra. O texto segue agora para sanção presidencial.

Manifesto contra a aprovação do PL

No dia 2 de junho, dezenas de entidades lançaram um manifesto se posicionando contra a aprovação da matéria. Segundo as entidades, o projeto cria um monopólio no setor de água e saneamento e retira a garantia de acesso aos serviços de saneamento básico para toda a população, inclusive aquela que não tem condições de pagar. Para elas, estes serviços ficam, agora, submetidos aos interesses privados, onde o lucro vem em primeiro lugar.

Além disso, parlamentares contrários a proposta, afirmam que o projeto não assegura nem preserva o patrimônio das empresas estatais de saneamento. Lembraram que a privatização do setor elétrico, por exemplo, piorou os serviços, encareceu as tarifas e para que o serviço fosse universalizado, foi necessário criar um programa público – o Luz para Todos – como alternativa para levar energia a quem não tem acesso ao serviço e cujo custo de implantação é muito caro e não reverte em lucro.

Também alertaram que as empresas privadas só terão interesse no “file”, deixando sem serviço comunidades pobres, do interior, assim como cmunidades indígenas, pequenos lugarejos, e locais que não darão retorno financeiro.

Passando a maior boiada da história

Em artigo na Carta Maior, o jornalista Luis Nassif lembra que nas próximas décadas, a água será a mais importante commodity do planeta. “O Brasil possui água em abundância, aquíferos, rios. É um bem público. Por isso não pode ser propriedade nem de estados, municípios, menos ainda de empresas privadas”, pontuou ele em artigo.  

Relata que lendo o projeto, achou um dos parágrafos inusitado, que institui, segundo ele, a figura esdrúxula da "empresa produtora de água", um personagem diferente da empresa que cuidará do saneamento. Ela definirá o que fazer e como fazer com a água. A regulação será apenas sobre a empresa de distribuição da água.
“A água serve para inúmeras finalidades. É um direito essencial, condição essencial de sobrevivência, garantidora da saúde. É geradora de energia, ponto central de saneamento, pesca, hidrovias. Nas bacias hidrográficas, o mau uso em uma ponta afeta o uso em outra. Essa complexidade e integração exige uma engenharia social complexa para a boa gestão. De repente, todo esse conjunto de direitos essenciais ficará sob a guarda de um "produtor de água"?”, questionou.
“Aproveitaram o Covid-19 para passar a maior boiada da história recente do país. Nem mesmo a compra de grandes extensões de terras brasileiras por estrangeiros, é um risco maior do que essa loucura – endossada pela mídia”.

Mais uma vez, na contramão

Como parece ter se constituído em prática, mais uma vez o Brasil está na contramão da história. Um estudo do Transnational Institute (TNI), um centro de estudos em democracia e sustentabilidade da Holanda, mostrou que, de 2000 a 2017, 884 serviços – incluindo água, energia, transporte público e coleta de lixo - foram reestatizados no mundo, sendo 83% deles de 2009 em diante. Somente Alemanha e França já desfizeram 500 concessões e privatizações do gênero, mas não só lá. Os episódios se repetem por todo o mundo e estão espalhados por países tão diversos quanto Canadá, Índia, Estados Unidos, Argentina, Moçambique e Japão.

De acordo com o levantamento, a priorização de lucros das empresas privadas é, na maior parte das vezes, conflitante com a execução de serviços de que a sociedade depende, que tem rejeitado as privatizações para reclamar de volta serviços públicos privatizados.

As populações querem preços mais baixos, aumento dos investimentos e melhorias na qualidade dos serviços. Muitas das privatizações falharam à custa da qualidade e acessibilidade dos serviços públicos e do bem-estar da população.

Entre as principais reclamações dos serviços privados estão aumentos expressivos das tarifas, que tornam os serviços inacessíveis para as famílias mais pobres, falta de investimentos em infraestrutura, deterioração das condições de trabalho e custos mais altos para o podepúblico, que tem que investir recursos, porque a empresa privada falha e não entrega o serviço.

Veja os senadores que votaram CONTRA a proposta e a FAVOR DO BRASIL:

Eliziane Gama (Cidadania-MA)
Humberto Costa (PT-PE)
Jaques Wagner (PT-BA)
Jean Paul Prates (PT-RN)
Mecias de Jesus (Republicanos-RR)
Paulo Paim (PT-RS)
Paulo Rocha (PT-PA)
Randolfe Rodrigues (Rede-AP)
Rogério Carvalho (PT-SE)
Sérgio Petecão (PSD-AC)
Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB)
Weverton (PDT-MA)

Assessoria de Comunicação

26/06/2020 14:31:20